A MÍDIA, O CENTRÃO E O GOVERNO
Por Percival Puggina (*)
Já perdi a conta do número de vezes que critiquei a postura do centrão desde que se organizou como força política dentro do Congresso durante a Assembleia Nacional Constituinte. Tenho sido rigoroso nessa denúncia porque vejo aquele ajuntamento de partidos como um dos grandes males de nossa democracia. Fica difícil pedir respeito ao parlamento quando o voto parlamentar é mercadoria à venda aguardando comprador. E o grande comprador é o Poder Executivo.
Ficou evidente, desde fevereiro do ano passado, que o novo governo enfrentaria problemas para aprovar seus projetos por ter no Congresso uma base parlamentar pequena e, com frequência, dividida. Malgrado a grande renovação na Câmara e no Senado, consequência da convicção da maioria do eleitorado sobre a necessidade de expurgar velhas raposas felpudas, não demorou um mês para o centrão ressurgir com muitas caras novas e costumes bem antigos, alardeando ter mais de 300 votos nas prateleiras dos partidos que o integram. O centrão derrubou medidas provisórias, virou projetos de lei do governo pelo avesso, aprovou despesas que comprometiam o equilíbrio orçamentário. Mas ficou longe da tesouraria.
Não há nenhuma novidade no que estou narrando. Novidade é a atitude da mídia militante que, de uma hora para outra, tão logo mudou o ocupante do Palácio do Planalto, passou a atacar o governo por não “negociar” com o parlamento. Em seguida, passei a ler que a “negociação” a que o governo se recusava correspondia a um “louvável protagonismo do legislativo nas decisões nacionais”. Faltava “articulação” ao governo!
Só isso já seria motivo de reprovação a um jornalismo que, por motivações políticas, ideológicas, empresariais ou pessoais, muda de entendimento conforme a conveniência. Se é para causar dano ao governo até o centrão vira gente boa.
Houvesse a grande imprensa cumprido seu papel com o bem do país, denunciado como chantagens as chantagens em curso, seria possível reverter essa conduta e fazer andar os projetos do novo governo. Tinha ela, contudo, um inimigo a derrotar.
Agora, Bolsonaro busca aproximação com o centrão. Vai distribuir cargos. E a mídia militante? Subitamente troca outra vez de entendimento. Agora, o que se lê é que o governo está se aproximando do fisiológico centrão e passa a andar em más companhias. Não há como pensar em outra coisa quando vejo que entre os oito líderes do bloco, fora Gilberto Kassab (PSD) e Marcos Pereira (REPUBLICANOS) quem não é réu na Lava Jato, ou foi condenado, ou já foi preso. O governo está comprando dificuldades para poder governar!
Li em Zero Hora de ontem (05/05), com chamada de capa, extensa matéria. “Centrão de volta ao velho hábitat”. E, em seguida: “Em busca de sustentação no Congresso, Bolsonaro negocia verbas e cargos com partidos vinculados a suspeitas de corrupção”. Conta a matéria que o deputado Arthur Lira (PP/AL) telefonou aos 40 deputados da bancada informando que a adesão ao governo estava concretizada e que ele colhia nomes para indicação a vagas na burocracia estatal. “Quem não estiver à vontade é melhor não vir – avisou o deputado, explicando que uma das missões é barrar um processo de impeachment”. E a mídia militante se julga dispensada de dar qualquer justificativa para suas movediças convicções.
As forças que se articularam para a construção deste momento político sabem muito bem o dano que causaram ao país em hora tão grave. Deixaram o presidente sem saída.
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Ah! Sobre o depoimento de Sérgio Moro, aparentemente valendo menos que o par de dois que estimei em artigo anterior, escreverei mais tarde.
(*) Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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Fonte: Site puggina.org, gentilmente disponibilizou este artigo para o Brasília In Foco News
Foto: Nadia Raupp Meucci