ARTIGO: A meticulosa construção de um inferno 

Por Percival Puggina (*)

Nem as opiniões mais pessimistas poderiam conceber, na tarde do dia 8 de janeiro de 2023, a narrativa do golpe de Estado e da abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Se alguém disser que anteviu isso, está influenciado pelo que passou a ser papagaiado pela mídia trans, aquela que se vê com credibilidade, mas virou militante da catástrofe nacional. Para a opinião pública imune ao Consórcio Goebbels, não havia e continua não havendo, pelo direito brasileiro, forma de enquadrar como golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito aquilo que assistíamos pela TV.
 
Poderia alguém imaginar, presenciando os fatos, até onde iria a capacidade de conceber, criar e pôr a funcionar, nos mínimos detalhes, o campo de concentração judicial, inferno na terra que seria proporcionado àquele grupo de manifestantes? “Deixai toda esperança, oh vós que entrais!”, lê Dante no frontispício do inferno…
 
Durmamos bem com isso ou não, escandalizados ou não, o fato é que uma revolução está em curso no Brasil. Ela tem uma longa e ininterrupta história pelo lado esquerdo do arco ideológico. A silenciosa revolução seguia seu curso de modo exitoso pelo domínio dos meios culturais, quando – máxima infâmia! – o ceguinho da direita achou um vintém e venceu a eleição de 2018. A expressão “o ceguinho achou um vintém” era usada frequentemente por um saudoso amigo para designar aquelas ocasiões em que a livre ação humana proporciona o inesperado, trazendo ao palco o “Imprevisível da Silva”. No caso, ele desmontou as certezas marxistas sobre o que faz andar a história.
 
Entraram em cena, então, os atores das instalações palacianas do STF. Estavam ali, nomeados por FHC, por Lula, Dilma e Temer. Não eram “editores da nação”, nem “poder moderador”, nem “os únicos supremos”, nem lhes cabia “empurrar a história”. Não eram “analistas de cenários”, nem tinham “protagonismo político”, nem estava entre suas atribuições a tarefa de “derrotar” algo ou alguém. Ajustaram, porém, que deviam “salvar a democracia”, como proclamam todas as revoluções. Quando arregaçaram as mangas, deixaram de lado suas teses acadêmicas. Afinal, não é com elas, mas com a política, que se empurra a história, certo? Toda revolução precisa de um AI-5 que mande o resto às favas. E foi assim que o manejo da política, em ascensão vertiginosa, passou para o comando do Supremo.
 
O problema da extrema esquerda brasileira, hoje, é a overdose. Com overdose, nenhuma receita funciona e essa fase da revolução parece estertorar porque não se salva o Estado de Direito com menos Direito, nem a Liberdade com menos Liberdade. Não foi por falta de alertas.

(*) Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Fonte: Site puggina.org, gentilmente disponibilizou este artigo para o DF In Foco News

Foto: Reprodução

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