Brasilienses devem R$ 1,5 bi de IPTU

 

Em 2017, de cada 100 imóveis 25 não pagaram o imposto. Inadimplência cresceu em 2018

brasiliense tem por hábito cobrar, e bem alto, seus direitos. A cidade sempre foi conceituada pela qualidade dos serviços públicos, que, de uns tempos para cá, vêm causando insatisfação pela crescente queda de padrão. E aí, nossos cidadãos gritam, vão às ruas, cobram retorno de seus impostos. No entanto, o mesmo o brasiliense que cobra o que lhe é de direito, vem pecando com as suas obrigações de contribuinte.

Levantamento exclusivo da coluna aponta que, em 2017, de cada 100 imóveis do DF, 25 não tinham pago o IPTU. Em 2018, a inadimplência aumentou para 28%. A dívida referente apenas a esses dois anos chega a R$ 1,5 bilhão, sem contar juros e multas. Metade desse valor é devido por proprietários de terrenos não edificados.

Nesses cálculos também não está contabilizada a Taxa de Limpeza Urbana – TLP. O dinheiro que não entrou no caixa seria suficiente para fazer chegar o metrô até o final da Asa Norte e, simultaneamente, construir a primeira etapa do VLT entre o Aeroporto e o início da Asa Sul.

Transformando essas taxas de inadimplência em dinheiro, em recursos que deveriam ser recolhido, o resultado advém assustador. Em 2017, deveriam ter entrado nos cofres do GDF, a título de IPTU, R$ 1.308.194.406,28, mas o efetivamente recolhido foi R$ 749.257.459,37, ou seja, uma quebra de caixa da ordem de 42,3%.

Em 2018, o retrato ficou ainda pior. Previsão de arrecadação de R$ 1.415.942.192,65 e efetivo pagamento de R$ 765.826.952,03. Ou seja, 46% da receita prevista não se materializaram. O rombo na arrecadação, apenas nesses dois exercícios fiscais, foi de R$ 1.512.360.812,47, sem computar juros, multas e correção monetária.

Maior inadimplência é de lotes vazios

Há um total de 1,5 mil lotes desocupados em Águas Claras

 

O maior nível de inadimplência de recolhimento de IPTU se refere aos lotes residenciais e comerciais não edificados. Ainda existem muitos lotes vazios (não construídos) na mão de seus proprietários. Muitos são projeções de edifícios.

No ano passado, eram listados 85.384 lotes não construídos. Desse total, mais de 25 mil são lotes em condomínios. Na Ceilândia, estão outros 9,3 mil terrenos; 8,1 mil em Samambaia; 2,5 mil no Plano Piloto; 2,4 mil no Lago Norte e 1,5 mil em Águas Claras.

O imposto não recolhido pelos donos de terrenos não edificados em 2017 e 2018 foi muito alto: R$ 762 milhões, 75% do que se esperava arrecadar nessa categoria. De cada R$ 100 reais que deveriam ser pagos, foram efetivamente depositados menos de R$ 25.

Proprietários de terrenos e projeções no Plano Piloto têm uma responsabilidade grande nesse calote. No bairro existem 2,4 mil lotes vazios e menos de 600 pagaram suas obrigações em 2017 e 2018, deixando um rombo de R$ 290 milhões.

Muitos desses imóveis, segundo técnicos do governo, estão nas mãos de especuladores imobiliários, que esperam a melhor hora para comercializar seus terrenos ou neles empreender. É nessa ocasião que negociam a quitação dos impostos, seja com o futuro proprietário ou com o próprio GDF, valendo-se de campanhas tipo Refiz, que concedem isenções e parcelamentos camaradas aos inadimplentes.

Perfil 10 RAs maiores contribuintes 2017

Região Administrativa % Origem da Renda do IPTU
Plano Piloto 41,31%
Águas Claras 7,46%
Condomínios 6,03%
Taguatinga 5,76%
Lago Sul 4,75%
Sudoeste/Octogonal 4,06%
Guará 3.65%
Lago Norte 3,53%
Park Way 2,75%
Ceilândia 2,63%

Perfil 10 RAs maiores inadimplentes 2017

Região Administrativa % de inadimplência em termos de valores não recolhidos
Park Way 49,61%
Condomínios 47,16%
Ceilândia 46,05%
Plano Piloto 44,55%
Guará 38,39%
Lago Norte 37,16%
Águas Claras 34,61%
Taguatinga 34,49%
Sudoeste/Octogonal 30,51%
Lago Sul 24,41%

Condomínios são maus pagadores

Quem também não é um bom pagador de IPTU são os proprietários de lotes em condomínios. Estimados em cerca de 150 mil imóveis, os terrenos, casas e comércios que se multiplicaram desde a década de 1980 – muitos de forma irregular ocupando áreas públicas -, não podem ser taxados de bons pagadores.

Nos dois anos pesquisados, a média do volume de imóveis que recolheram suas obrigações foi da ordem de 80 mil unidades. Em termos financeiros, nos dois anos deveriam ter pago R$ 161,7 milhões, mas efetivamente recolheram R$ 83,2 milhões.

Park Way é o campeão do calote

Entre as dez regiões administrativas que potencialmente deveriam recolher mais IPTU, o Park Way aparece como o campeão de imposto não pago. Com uma renda média mensal domiciliar de R$ 15.671,92 e renda per capita de R$ 5.207,54, o bairro ocupa o segundo lugar na lista dos mais ricos e caros do DF. Entretanto, de cada dois imóveis registrados na Secretaria da Fazenda, apenas um pagou o IPTU em 2017 e 2018.

A situação é mais ou menos a mesma no Guará. A cidade tem um padrão econômico mediano. A renda média domiciliar, em 2015, era de R$ 7.311,79 e a per capita de R$ 2.683,23. Em 2017 e 2018, a cidade foi, respectivamente, a 7ª e a 6ª maior geradora potencial de IPTU. Lá, o padrão de não pagamento, em 2018, chegou a 50%, bem acima do ano anterior (38,4%), o que deve ser reflexo da crise salarial e do desemprego.

O Plano Piloto (renda domiciliar média de R$ 13.489,93 e per capita de R$ 5.569,45) é o maior contribuinte de IPTU do DF. Em 2018, seus 167.631 imóveis deveriam ter gerado cerca de R$ 558 milhões em imposto predial. Mas a história foi outra. O caixa da Fazenda computou só R$ 298 milhões. Mais de 46% estão no vermelho e podem ser lançados na dívida ativa do DF.

Nona maior potencial contribuinte em 2018, Ceilândia (renda domiciliar média de R$ 3.076,00 e renda per capita de R$ 915,81) trouxe graus de inadimplência semelhantes aos bairros citados anteriormente. Em 2017 e 2018, as taxas de não quitação atingiram 46% e 48,3%, respectivamente.

Lago Sul, o melhor pagador

O Lago Sul está no topo da lista dos bairros mais ricos e caros do DF – renda média domiciliar, calculada em 2015, em R$ 21.695 e per capita de R$ 8.117. Potencialmente, é a quinta região administrativa a recolher IPTU e a primeira em termos de bom pagador. Em média, nos dois anos pesquisados, 74% dos imóveis recolheram corretamente seus impostos. Assim mesmo, cerca de R$ 34 milhões deixaram de ser recolhidos nos dois anos do levantamento.

O Setor Sudoeste e a Octogonal, juntos, são os melhores pagadores de IPTU.  São pouco mais de 31 mil imóveis e cerca de 29 mil pagaram direitinho o que deviam. A taxa média de inadimplência calculada nos dois anos sobre os valores devidos foi de 32,7%, que traduzidos em dinheiro representam também cerca de R$ 34 milhões.

Regiões administrativas importantes em termos de arrecadação que apresentam padrão médio de efetivo recolhimento são Águas Claras, Taguatinga e Lago Norte. Mas os níveis de inadimplência variam de 34 a 40%.

Realidade imobiliária: embaixadas são isentas

Dos quase 1,5 milhão de imóveis registrados no DF em 2018, 734.948 eram residenciais e foram tributados com a menor taxa de IPTU: 0,30% sobre o valor venal.

A segunda maior fatia, com 126.666 imóveis, é formada por unidades não residenciais edificadas. São estabelecimentos comerciais, industriais e de serviços. Para esses, a alíquota é de 1%. Esses pagam a maior alíquota de IPTU: 3%.

O governo federal, as embaixadas e representações de órgãos internacionais com status diplomático não recolhem IPTU.

Rombo também no IPVA

Mais de 300 mil proprietários de veículos também são inadimplentes. Foto: Antônio Sabino – Brasília Capital

 

O não recolhimento de impostos pelos contribuintes candangos não se limita ao IPTU. Em 2018, levantamento do Detran apontou que mais de 315 mil contribuintes (pessoas físicas e jurídicas) proprietários de 367 mil veículos não pagaram uma única parcela do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).

O rombo nos cofres somou R$ 269 milhões, sem contabilizar aqueles que pagaram uma ou mais parcela do IPVA mas não quitaram totalmente. Em 2017, foram R$ 103 milhões em IPVA não pagos. Em 2016, R$ 77 milhões. Os contribuintes responsáveis pelo calote já foram inscritos em dívida ativa e estão sujeitos às sanções previstas pelo atraso, diz a Secretaria da Fazenda.

Sem dinheiro, a máquina emperra

Governos não têm máquina de fazer dinheiro. Sua renda depende do contribuinte. É claro que o cidadão espera uma boa relação custo-benefício. Para um imposto pago, que não é barato, um serviço de melhor qualidade.

Mas quando uma parcela expressiva da população deixa de pagar sua cota, ela prejudica duplamente a comunidade. Primeiro, porque a carga das despesas públicas recai sobre quem paga em dia. Segundo, porque os serviços públicos não atingirão a qualidade esperada por aqueles que fizeram o dever de casa.

Com essas verbas não recolhidas, certamente o GDF não estaria decretando Estado de Emergência na Saúde Pública, a qualidade da Educação poderia ser bem outra e as ruas e avenidas da cidade estariam com bem menos buracos.

Crise atingiu todo o DF

É verdade que a crise pegou muita gente. O desemprego aumentou. A renda caiu, o comércio vendeu menos. Nesse cenário, impostos acabam sendo a última preocupação para se pagar. Mas esse é um circulo vicioso. Menos impostos, menos investimentos e gastos públicos, gerando mais desemprego e recessão.

Não existe, contudo, um perfil sócio-geográfico e econômico especifico que concentre maiores devedores. Nessa situação, há tanto imóveis localizados em áreas nobres do Distrito Federal, quanto em localidades mais carentes. A inadimplência pode alcançar bairros chiques e de alto poder aquisitivo e também cidades economicamente mais desfavorecidas.

Alíquotas de IPTU segundo a natureza do imóvel

3% Para imóveis não edificados
1% Para imóveis não residenciais edificados
0,30% Para imóveis edificados com fins exclusivamente residenciais*
0,30% Para imóveis com destinação comercial cuja utilização é residencial

Perfil 10 RAs maiores inadimplentes 2018

Região Administrativa % de inadimplência em termos de valores não recolhidos
Park Way 54,85%
Guará 50,72%
Condomínios 49,36%
Ceilândia 48,32%
Plano Piloto 46,45%
Lago Norte 39,11%
Taguatinga 38,34%
Águas Claras 37,73%
Sudoeste/Octogonal 34,88%
Lago Sul 27,91%

 

Fonte: Jornal Brasília Capital

Por Chico Sant’Anna

Foto: Antonio Sabino/Brasília Capital

 

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