Caminhos da Reportagem: Pandemia, mal sem fronteiras
O programa vai ao ar neste domingo, às 20h, na TV Brasil
No mundo existem, hoje, 193 países, cerca de 7.75 bilhões de habitantes e um enorme problema em comum: um vírus. Em 20 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que o surto da doença causada pelo novo coronavírus (Covid, Corona Virus Disease) havia se transformado em pandemia.
Brasil afora, vidas e sonhos foram interrompidos pela covid-19, doença que teve origem na China, no final do ano de 2019, e em menos de três meses se espalhou por todo o mundo, obrigando vários países a adotar medidas de isolamento social e restrições de acesso às suas fronteiras, para conter o avanço da pandemia. Por todo o mundo, as pessoas têm sido forçadas a rever hábitos, mudar a rotina, abandonar sonhos em curso e traçar novos objetivos.
O Caminhos da Reportagem deste domingo, que vai ao ar às 20h na TV Brasil, vai contar a história de alguns brasileiros que estavam (ou continuam) fora do Brasil durante a pandemia de covid-19 e foram surpreendidos pela decretação da quarentena obrigatória, estando muito longe de casa. O medo de contágio, a dúvida entre partir ou ficar, a angústia de não encontrar voos de volta e a distância da família. Não são poucas as dificuldades enfrentadas por um estrangeiro em uma situação de emergência de saúde internacional.
“Sob o ponto de vista psicológico, em termos emocionais e afetivos, em termos cognitivos, estamos diante de uma enorme ameaça, estamos frente a um agente invisível, desconhecido, que ameaça a vida de todos. O medo e a insegurança obrigando-nos a nos isolar socialmente, justamente quando é da natureza humana estar na companhia do outro; quando estamos juntos somos mais fortes, mais capazes de lidar com as ameaças”, explica o psicólogo Fernando Freitas, pesquisador da Fiocruz.
Foi o medo, justamente, que fez a estudante de jornalismo e relações internacionais Marina Guimarães largar o mestrado na Universidade de Nova York e voltar para o Brasil. “Eu trancada no meu quarto, sem conseguir sair nem de casa, também não sabendo se eu ia poder voltar para o Brasil. Então foi realmente, assim, uma situação muito angustiante, de se sentir impotente perante essa situação toda” – revela Marina, que embarcou num voo de volta para o Brasil no dia 17 de abril.
“Liguei pra minha mãe no dia 15, aos prantos, desesperada, falando mãe não consigo mais ficar aqui, eu não quero mais ficar sozinha!. Comprei minha passagem no dia 16 pra viajar no dia 17. Eu só joguei tudo dentro da minha mala, peguei um Uber, no aeroporto, clima de pânico instaurado, o aeroporto vazio”, lembra a estudante.
Para aqueles que desejam voltar, a dificuldade de encontrar voos tem sido um obstáculo grande, não só devido ao preço das passagens, mas, também, devido à suspensão de rotas, cancelamentos e remarcações sucessivas, que muitas vezes é preciso recorrer à ajuda dos consulados brasileiros para conseguir voltar ao Brasil. Foi assim que a artesã Lorena Mello conseguiu deixar o Equador. Seu visto de permanência no país já havia expirado e ela teve dificuldades para se deslocar da cidade de Manta, no litoral, até a capital Quito, distante quase 400 quilômetros ao norte, porque as estradas, assim como as fronteiras, já haviam sido fechadas, e era necessária uma permissão especial para passar pelos bloqueios levantados pelo Exército equatoriano.
“Então eu entrei em contato com a embaixada, expliquei a minha situação, perguntei se eles tinham algum plano para o brasileiros que estavam presos lá no Equador. Eles se organizaram e fizeram um voo comunitário para os brasileiros que estavam lá, desde Quito até o aeroporto de Guarulhos”, conta Lorena.
Dados do Ministério das Relações Exteriores estimam que, até o momento, foram repatriados mais de 21.800 brasileiros que estavam retidos em outros países, por meio de 21 voos humanitários fretados pelo Governo Federal.
“O Itamaraty criou um gabinete de crise durante a pandemia para coordenar o apoio aos brasileiros em todos os países em que nós temos consulados ou embaixadas. A ideia desse gabinete de crise é fazer com que haja uma centralização das informações, uma coordenação das atividades e um apoio aos brasileiros, sobretudo no caso de brasileiros que se encontram em países que não têm mais voos para o Brasil”, explica o vice-cônsul do Brasil em Nova York, Marco Antônio Nakata.
O maior número de repatriados veio de Portugal, com um total de 8.012 brasileiros, até o dia 13 de maio; em seguida, Peru (1.610), México (1.086) e Argentina (1.062). Ainda segundo o Itamaraty, 6.580 brasileiros que estão retidos no exterior solicitaram ajuda para retornar ao Brasil. Esse número inclui residentes no Brasil que tiveram passagens de retorno canceladas e migrantes que querem voltar em decorrência da crise, sendo que, nesse último caso, a repatriação é condicionada à verificação de situação de grave desvalimento financeiro.
Portugal
Mesmo em Portugal, país com o qual o Brasil guarda estreitas relações, históricas e culturais, o dilema dos cerca de 200 mil brasileiros que ficaram não é, contudo, mais fácil. Há muita incerteza quanto à retomada da economia no país, muito atrelada ao setor de turismo, que tem sido um dos mais impactados pela pandemia de coronavírus.
“Resta a incógnita da crise econômica. O que isso vai acarretar justamente para essa população brasileira, que à luz do fechamento do comércio e tudo estão perdendo o emprego e, em última instância, desejam retornar para o Brasil”. A preocupação apontada pelo embaixador do Brasil em Lisboa, Carlos Alberto Simas Magalhães, é semelhante à enfrentada pela família da jornalista Renata Cabral. Ela foi para Portugal em setembro de 2019, com o marido e a filha pequena, para cursar um mestrado na Universidade de Coimbra, mas agora refaz as contas para saber se não seria melhor antecipar o retorno. “É impressionante como um evento acontece e de uma hora para outra vira a sua vida de cabeça para baixo” – conclui.
Quem fica
Mas há aqueles que preferem ficar no exterior. É o caso da brasileira Júlia Milan que, apesar do medo, resolveu permanecer em Nova York. Ela trabalha há oito anos em uma ONG e decidiu não abrir mão desse sonho. “Eu sempre quis trabalhar nessa área de educação internacional, de ONGs internacionais, e Nova York é um centro disso com a ONU aqui, então, para chegar aqui foi incrível”, diz ela, sem esconder, contudo, sua apreensão de estar longe de casa. “Acho que a dificuldade foi mais o emocional mesmo, de lidar com o trauma né, você ficar longe da sua família, dos seus amigos, a preocupação com os amigos e com a família, tanto aqui quanto aí”.
Desistir também não estava nos planos de Beatrice Costa Silva, estudante de Arquitetura que faz intercâmbio em Barcelona há um ano: “Se eu tivesse voltado para o Brasil seria a interrupção de um sonho”. Para ela, o fato de as aulas terem continuado on line, com a mesma exigência por parte dos professores, ajudou a manter a cabeça ocupada.
“Não é fácil, né! Quando se está no país já é complicado; fora do país, numa crise como essa, é mais complicado ainda. Tentar resolver o máximo aqui sozinha e tentar manter o psicológico também”, confessa Beatrice.
Vamos conhecer essas e outras histórias em mais um Caminhos da Reportagem especial sobre a pandemia de coronavírus neste domingo, às 20h, na TV Brasil.