DFTrans montou “arapuca” para flagrar fraudes de auditor
Sob orientação da PCDF, autarquia permitiu que Pedro Jorge Brasil, apontado como líder do esquema, acessasse o sistema após deixar a prisão
Apontado como o suposto líder de uma fraude que pode ter chegado a R$ 1 bilhão no sistema de bilhetagem eletrônica do transporte público, o auditor Pedro Jorge Brasil foi monitorado desde sua saída da cadeia, após passar 21 dias preso em outubro de 2016.
Por orientação da Polícia Civil, o Transporte Urbano do Distrito Federal (DFTrans) montou uma “arapuca” para flagrar o servidor, lotado desde 2014 na Subsecretaria de Fiscalização, Auditoria e Controle (Sufisa) da Secretaria de Mobilidade.
Segundo o diretor-geral do DFTrans, Léo Carlos Cruz, um dia após deixar a prisão, em 26 de outubro passado, Pedro Jorge usou uma senha para acessar o Sistema de Bilhetagem Automática (SBA) da autarquia. Depois de ser alvo da polícia, houve um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) aberto contra ele, mas continuou recebendo salário. Em seu último contracheque disponível no Portal da Transparência, de janeiro deste ano, a remuneração bruta foi de R$ 18.830,75.
“Ele nunca havia usado essa senha. A gente sabia que o Pedro Jorge conseguia entrar no sistema, mas não imaginávamos que o acesso dava tantas possibilidades de alterar o SBA. Só não bloqueamos a senha por orientação da Polícia Civil, para pegar a fraude” Léo Carlos Cruz, diretor-geral do DFTrans
Ainda de acordo com o diretor-geral do DFTrans, na primeira utilização da senha, o desfalque foi de R$ 20 mil. “Só o que ele movimentou chegou a R$ 3,5 milhões”, disse Cruz, em entrevista na tarde desta quinta-feira (15/3) para explicar detalhes da megaoperação da Polícia Civil e do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) batizada de Trickster – um desdobramento da Checklist.
Nesta quinta-feira, durante a megaoperação, 34 pessoas foram presas. Entre elas, estão Pedro Jorge e a mulher dele, Hedvane Ferreira. Os dois foram detidos em casa, no Gama. A Justiça autorizou ainda a quebra do sigilo bancário, fiscal e dos cartões de crédito do servidor.
Conforme ressaltou o delegado-chefe da Coordenação de Repressão a Crimes Contra o Consumidor, Ordem Tributária e Fraudes (Corf), Wislley Salomão, o sistema do DFTrans tinha algumas inconsistências que possibilitaram as fraudes, as quais incluíam também o passe livre. “Era uma maquininha de dinheiro para todo mundo. Passava o cartão no validador sem sair da garagem”, explicou.
Os investigadores acreditam que grupo movimentou mais de R$ 1 bilhão e aplicou boa parte do dinheiro no mercado imobiliário.
Outra fraude identificada foi o uso do mesmo cartão em linhas diferentes, em curto espaço de tempo, como Núcleo Bandeirante e Brazlândia. Vinte e oito pessoas foram indiciadas pelos crimes de peculato eletrônico, associação criminosa e lavagem de dinheiro. Seis estão foragidas.
Confira imagens da operação:
DFTrans não quer intervenção do MPDFT
Segundo Lenna Daher, da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e Social (Prodep), além da responsabilização dessas pessoas, é necessário estancar a fraude. “Precisamos interferir no Sistema de Bilhetagem Automática para que isso não volte a ocorrer”, disse.
A declaração, contudo, não foi bem recebida pela Secretaria de Mobilidade. “Haveria justificativa para essa atitude se nada estivesse sendo feito. A denúncia nasceu de dentro do governo. Uma intervenção do MPDFT não se justifica”, afirmou o chefe da pasta, Fábio Damasceno.
O secretário disse ainda que Pedro Jorge será afastado por 60 dias e responderá a Processo Administrativo Disciplinar (PAD), o qual pode resultar na demissão do servidor. “Depois da operação Checklist, ele foi suspenso por 120 dias. Agora serão mais 60. É preciso respeitar os trâmites legais”, completou Damasceno.
A fraude
Segundo a Polícia Civil, o esquema funcionava desde 2014, quando Pedro Jorge estava lotado no DFTrans. A quadrilha descarregava os créditos de cartões de vale-transporte nos validadores de ônibus, de forma sequencial e em linhas distintas. Tudo era feito com empresas de fachada e trabalhadores fantasmas.
Além de Pedro Jorge e da mulher dele, foram presos ex-funcionários do DFTrans, um empregado da Viação Pioneira e outras pessoas que participavam da fraude, entre elas Valdir Luiz França, velho conhecido de políticos do Distrito Federal pela atuação como cabo eleitoral, e Alexandre Lopes de Alencar, assessor parlamentar na Câmara Legislativa. Recentemente, ele estava trabalhando com cooperativas de transporte em Planaltina de Goiás, Entorno do DF.
Conforme Fábio Damasceno destacou, haverá punição para as cooperativas envolvidas na fraude e que tiverem participação comprovada no esquema. “Serão abertos procedimentos, com direito ao contraditório e ampla defesa assegurados, que podem acarretar o cancelamento dos contratos com essas empresas”, disse.
Segundo Damasceno, é preciso respeitar os contratos para não prejudicar a população. “Por enquanto, o que sabemos da Pioneira é o envolvimento de um servidor. Vamos apurar e, se ficar comprovada a participação da empresa, vamos seguir todos os trâmites legais para o cancelamento do contrato”, afirmou.
Por meio de nota, a Viação Pioneira negou que um funcionário da companhia tenha sido preso. A empresa disse que “trabalha pautada pela mais absoluta legalidade e transparência, confiando nas autoridades responsáveis pela investigação, e se coloca à disposição para todo e qualquer esclarecimento necessário”.
Fonte: Metrópoles
Foto: Mirelle Pinheiro/Metrópoles