Ex-secretário de Saúde cai em grampo após prestar depoimento à polícia
Fábio Gondim revelou ao advogado que pediu a saída de Marcello Nóbrega do cargo de subsecretário, mas o governador “não concordou”
Em conversa interceptada no âmbito da Operação (12:26), o ex-secretário de Saúde Fábio Gondim (foto) afirmou ao advogado Marcos Raposo ter solicitado a exoneração de Marcello Nóbrega, então subsecretário de Administração Geral da pasta, mas “o governador não concordou”. A revelação, feita em diálogo grampeado logo após depoimento de Gondim à polícia, consta no Inquérito nº 386/2018, ao qual o Metrópoles teve acesso com exclusividade.
Marcello Nóbrega gozava da confiança do governador do DF, Rodrigo Rollemberg (PSB), e da primeira-dama, Márcia Rollemberg. Prova disso foi a permanência dele no poder público, passando por várias secretarias do Governo do Distrito Federal (GDF) mesmo após ter o nome envolvido na CPI da Saúde e na Operação Drácon. Sua carreira foi interrompida na terça-feira (7/8), quando ele pediu exoneração, pouco após agentes revirarem o Palácio do Buriti.
A conversa ocorreu em 27 de abril de 2018. “Não é que não concordou, mas ficou implicitamente claro que ele não iria tirar, e um dos motivos principais por que eu saí foi esse”, confessou Gondim.
De acordo com o ex-gestor, se o delegado tivesse o questionado, ele teria contado que a motivação foi a aparição de Marcello Nóbrega com um termo de referência de R$ 500 milhões, “prontinho, e obrigando outro subsecretário a assinar”, mas o servidor não quis. Gondim, segundo o inquérito, afirmou que o documento foi utilizado em outra pasta e uma única empresa ganhou todos os lotes.
O inquérito destaca “certo protagonismo no pagamento e negociação de dívidas” por parte de Marcello Nóbrega, “ao demonstrar que possuía capacidade de priorizar os pagamentos”. Datada de 2015, a nota de empenho direcionada ao Hospital Home, no valor de R$ 1.071.302,00, foi assinada por ele.
Depoimento
Gondim ficou à frente da Secretaria da Saúde por sete meses – foi exonerado em março de 2016. À polícia, o ex-gestor confessou ter pedido a substituição de Marcello Nóbrega por considerá-lo “muito desagregador”, mas não foi atendido.
Segundo Gondim revelou, havia prioridade de pagamentos nos casos em que a dívida pudesse ocasionar a interrupção de serviços. Conforme o texto observa, o Hospital Home não se encaixava nesse critério, pois o contrato havia sido rescindido.
O ex-secretário afirmou não se recordar dos pagamentos realizados ao Hospital Home. Esclareceu, ainda, que os repasses eram feitos pelo ordenador de despesa, e ele só era informado depois. “Assim, mais um motivo que indica que o pagamento autorizado por Marcello Nóbrega ocorreu de forma indevida e visando favorecer a empresa Home em detrimento de outros fornecedores”, frisou o inquérito.
O inquérito ainda aponta que Gondim questionou à Procuradoria-Geral do DF sobre a viabilidade para pagar os atrasados, de forma indenizatória. Assim, foi autorizado o pagamento dos valores devidos ao Home, mesmo em um período de crise no qual o governador Rodrigo Rollemberg ameaçava atrasar ou parcelar o salário dos servidores públicos do DF.
Os atos geraram a suspeita da polícia e do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) de suposta tentativa de beneficiamento do hospital particular.
Histórico
A Operação (12:26) – liderada pela Coordenação Especial de Combate à Corrupção, ao Crime Organizado e aos Crimes Contra a Administração Pública (Cecor) – apura suposto tráfico de influência, advocacia administrativa e organização criminosa envolvendo integrantes do governo no Palácio do Buriti.
O inquérito aponta que Marcello Nóbrega compõe a “periferia da organização”, pois foi designado para praticar atos específicos porque era o ordenador de despesa da Saúde à época.
Além da suspeita de favorecimento em pagamentos de dívidas da Secretaria de Saúde e ilegalidades em contratos firmados pela Casa Civil, investigadores chegaram a um suposto favoritismo indevido ao projeto de ampliação do Iguatemi Shopping, no Lago Norte.
De acordo com a Polícia Civil, representantes do shopping queriam aumentar a área de ocupação do empreendimento, mesmo em desacordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos).
Entre os alvos nesse episódio, estão: o empresário Leonardo Rocha de Almeida Abreu, que é irmão do chefe de Gabinete da Casa Civil, Guilherme Rocha de Almeida Abreu; o administrador do Lago Norte, Marcos Woortmann; e dois ex-assessores do distrital Rodrigo Delmasso (PRB), Luiz Fernando Messina e Hermano Gonçalves de Souza Carvalho.
Cargos
No GDF, Marcello Nóbrega foi subsecretário de Administração da Secretaria de Gestão Administrativa e Desburocratização do Distrito Federal, entre 13 de janeiro e 24 de março de 2015. Depois, assumiu a Subsecretaria de Administração Geral da Secretaria de Saúde, cargo que ocupou até 1º de abril de 2016.
Naquele mesmo dia, foi nomeado subsecretário de Logística e Infraestrutura da Saúde, função na qual ficou até 16 de setembro de 2016. Mas não durou muito a permanência na pasta, da qual logo o remanejaram, após virar alvo de investigações relacionadas à Operação Drácon. Marcello Nóbrega deixou a administração pública local em 30 de outubro de 2017. Ao ser destituído do cargo de assessor da pasta das Cidades, foi para o Senado Federal.
Em 26 de abril de 2018, voltou a encontrar guarida no Palácio do Buriti: tornou-se assessor da Secretaria Adjunta de Relações Institucionais e Sociais da Casa Civil. Pediu exoneração na terça-feira (7), horas após a ação da Polícia Civil em parceria com o MPDFT ser deflagrada.
O outro lado
Na terça-feira (7) – data em que foi deflagrada a Operação (12:26) –, mesmo sem ainda ter conhecimento da íntegra das investigações, o GDF emitiu nota para esclarecer pontos específicos divulgados até então pela Polícia Civil e pelo Ministério Público. No documento, o governo nega as acusações feitas pelos investigadores, de que houve prática de advocacia administrativa e tráfico de influência.
Sobre os repasses feito ao hospital Home, de R$ 1 milhão, a gestão Rollemberg registra que “quando o atual governo assumiu, existiam serviços realizados por diversos fornecedores e não pagos da ordem de R$ 600 milhões, sem contratos. Ao longo dos anos foram regularizados os pagamentos, de acordo com a legislação. Hoje, esses serviços têm contratos”, segundo informa nota assinada pela Secretaria de Comunicação.
Fábio Gondim disse que não se recorda quais eram as dívidas, apenas que eram referentes a exercícios anteriores. Segundo o ex-secretário de Saúde, a Procuradoria-Geral do DF foi questionada porque não “queria correr o risco pagar algo que não era devido”. “Por isso, procurei a procuradoria para saber se o pagamento seria feito dentro da lei”, concluiu.
Marcello Nóbrega não se pronunciou até a última atualização deste texto.
Fonte: Metrópoles
Foto: Michael Melo/Metrópoles