Gerson Vicente: uma “fábrica de empregos” para o DF

Em entrevista à Agência Brasília, subsecretário de Integração de Ações Sociais conta como o governo está focado em profissionalizar alunos de baixa renda e prepará-los para o mercado de trabalho

Servidor concursado da carreira de gestor em política públicas e gestão governamental, o novo subsecretário de Integração de Ações Sociais do DF, Gerson Vicente, está à frente das reformulações para uma nova fase da Fábrica Social. Criada em 2014 para atender à população de baixa renda com cursos de capacitação, a estrutura agora está focada em fabricar oportunidade de emprego e renda no DF.

“Queremos que, em um futuro próximo, todos os alunos saiam daqui empregados para deixar a condição de vulnerabilidade social e ganhar a dignidade de ser recolocado no mercado”, afirma Vicente, em entrevista à Agência Brasília.

Para atingir esse objetivo, conta Gerson, a Secretaria de Trabalho vai fazer um cadastro unificado de ex-alunos e atuais para compor o banco de dados das 19 agências do trabalhador distribuídas pelo DF. “Outra iniciativa é a criação de um centro de empreendedorismo, que queremos lançar em breve”, adianta.

Ainda segundo o subsecretário, a partir de agora os cursos da Fábrica Social passam a ter um ano de duração, inclusive com possibilidade de até três meses de estágio em empresas do setor produtivo local. A oferta também será ampliada. Em apenas um ano, o governo pretende capacitar cerca de 1,2 mil pessoas para o mercado de trabalho.

Confira a entrevista:

Quem são os alunos atendidos pela Fábrica Social? Qual o perfil para ingresso em um dos cursos oferecidos?
Hoje, nosso aluno é um cidadão que está sendo atendido pelo Estado em algum programa assistencial e precisa ter a continuidade da sua inclusão social, com o ingresso no mercado de trabalho. Para participar dos cursos, as pessoas precisam estar no Cadastro Único (Cad) do governo federal, ser beneficiário do programa Bolsa Família e ter renda familiar de até R$ 178. Ou seja, são pessoas que estão em situação de vulnerabilidade extrema.

Por que o governo optou por deixar a Fábrica Social na estrutura da Secretaria de Trabalho, e não mais na Secretaria de Desenvolvimento Social?
Temos hoje uma nova missão com a Fábrica Social, por isso voltamos para a estrutura da Secretaria de Trabalho. Agora, queremos realmente incluir as pessoas e integrá-las à sociedade com a dignidade de ter um emprego. Nossa missão é incluir as pessoas no mercado de trabalho de forma profissional, mais capacitada e qualificada para que conquistemos, realmente, um desenvolvimento econômico e social para o DF. Percebemos que estávamos conduzindo uma política pública de inclusão, de certa forma limitada, porque a capacidade da Fábrica é muito maior. A inclusão social ainda é o nosso DNA, mas o foco é o desenvolvimento econômico e financeiro das pessoas, com geração de negócios, de empreendimentos, com empoderamento. Nossos alunos estão na transferência de renda, não podemos deixar que se acomodem com um auxílio financeiro. Temos de ensinar a buscar o peixe sozinho. Só assim vamos realmente tirar as pessoas da situação de vulnerabilidade e poderemos atender outras para que também tenham condições de mudar de vida.

Então, o novo modelo adotado vai ampliar o atendimento as pessoas carentes?
Sim. Tivemos um aumento de quase 50%. Na verdade, a Fábrica fazia um processo de seleção de 1.200 pessoas a cada dois anos. Agora, teremos 1.200 pessoas por ano. Ou seja, nossa capacidade dobrou. Eu diria inclusive que esse novo modelo caminha para uma transformação na ideia conceitual da Fábrica. Queremos que, em um futuro próximo, todos os alunos saiam daqui empregados para deixar a condição de vulnerabilidade social e ganhar a dignidade de ser recolocado no mercado.

Nossa missão é incluir as pessoas no mercado de trabalho de forma profissional, mais capacitada e qualificada para que conquistemos, realmente, um desenvolvimento econômico e social para o DFGerson Vicente, subsecretário de Integração de Ações Sociais

O que a Fábrica Social produz?
Nossa produção é diversificada: produzimos camisetas, bonés, jalecos e até marcenaria. Hoje, o que é produzido por lá volta para ser utilizado nas necessidades mais urgentes do governo. Produzimos artigos para escolas, hospitais, centros de saúde e até para atender pequenas necessidades das administrações regionais. A Polícia Civil, por exemplo, precisou que fizéssemos uniformes e quimonos para alunos da rede pública que participam de um projeto de inclusão. Fizemos bola e redes também. Neste ano passamos ainda a produzir uns kits de roupas para mulheres vítimas de violência. Porque, às vezes, quando elas vão à delegacia denunciar um caso de estupro, por exemplo, precisam deixar as roupas como prova do crime. É um pouquinho de dignidade em um momento tão difícil da vida dessas mulheres. Fábrica Social acabou adotando um papel de braço ajudador do governo em suas necessidades urgentes. Não corremos e nunca vamos concorrer com as empresas do setor, que produzem tudo em larga escala. Até porque não podemos vender nada. O que produzimos hoje é algo limitado para atender às necessidades mais urgentes. Quando o governo precisa realmente de volume, o setor produtivo é acionado e abrimos um edital para licitar os serviços.

Quais os cursos oferecidos hoje pela Fábrica Social?
Quando entram no processo formativo da Fábrica, os alunos aprendem fazendo. Essa é a metodologia aplicada por nós. Ou seja, em um curto espaço de tempo, ele está apto a poder fazer coisas para ganhar dinheiro. O que é muito importante. Estamos hoje preparando realmente nossos alunos para o mercado de trabalho, por isso nossa preocupação com a profissionalização dos serviços. Hoje temos cinco cursos: confecção de vestuário e artigos esportivos; construção civil; sistema fotovoltaico; horta, jardinagem e paisagismo; e marcenaria. Todos com mais de 500 horas/aula. Para o de confecção, por exemplo, estamos oferecendo cinco certificações.

Houve mudanças na grade curricular do curso de confecção?
Hoje, todo o processo formativo dos cursos foi modernizado e definimos uma linha pedagógica voltada para o Código Brasileiro de Formação, que identifica a qual profissão está ligada a capacitação. A partir do próximo ano, o aluno de confecção, por exemplo, vai sair da Fábrica Social com certificação para cinco formações: costureiro de malha; costureiro em tecido plano; talhador industrial de tecidos; costureiro de assessórios e materiais esportivos; além de serigrafista e modelista. É um curso extremamente rico e completo. Outra novidade é que teremos no ciclo formativo a vivência profissional, como uma espécie de estágio. O aluno vai diretamente da qualificação para uma empresa do ramo e lá ficará por até três meses aprendendo a rotina empresarial. E até, quem sabe, poderá ser contratado.

Há alguma possibilidade de ampliar o alcance dos cursos da fábrica social para além das pessoas cadastradas no Cadastro Único?
É um desejo nosso ampliar tanto em qualidade quanto em oferta do número de vagas. Por isso pensamos em descentralizar a oferta para as regiões administrativas. Hoje, estamos com um projeto piloto junto com a Administração de Samambaia. Lá estamos realizando um curso de jardinagem, horta e paisagismo. A ideia é levar para todas as cidades a oferta desses cursos, inclusive para ampliar para além das pessoas inscritas no Bolsa Família. É determinação do governador Ibaneis que a gente leve os cursos de capacitação e profissionalização para todas as pessoas que necessitam de qualificação para ingressar no mercado de trabalho. No DF, temos cerca de 320 mil desempregados e o que tem levado essas pessoas a continuarem nessa condição é a baixa qualificação.

Além da qualificação, o que o governo oferece para esses alunos de baixa renda?
Hoje, o aluno da fábrica social recebe em média R$ 450, incluídos os valores do auxílio alimentação, transporte e o incentivo para o desempenho. Quanto mais ele se dedica ao processo de aprendizagem, passa a receber um valor maior como incentivo financeiro. Aqueles que se destacam mais, são escolhidos para serem monitores no mês seguinte. Isso é muito importante porque acabam sendo mentores dos outros e isso é um estímulo para tentar crescer cada vez mais. O orçamento da fábrica hoje está em torno de R$ 8 milhões por ano e 80% desse recurso é investido de forma direta no pagamento dessas bolsas.

Estamos promovendo formas de conectarmos nossos alunos aos empresários e à comunidadeGerson Vicente, subsecretário de Integração de Ações Sociais

A profissionalização para ingresso no mercado de trabalho é a nova marca que a Fábrica Social quer imprimir. Como vocês pretendem trabalhar isto na prática?
A Secretaria de Trabalho tem 19 agências do trabalhador, que funcionam como instrumento de captação de oportunidades no setor produtivo. Por isso vamos cadastrar nossos alunos e encaminhar os dados diretamente para as agências do trabalhador. Quando o perfil do nosso aluno for convergente com perfil exigido na vaga de emprego disponível, vamos encaminhar nosso aluno para a entrevista. E, assim, ajudar no ingresso do mercado de trabalho. Esse cadastro já vamos iniciar com os alunos egressos e com aqueles que ingressaram em junho. Outra iniciativa é a criação de um centro de empreendedorismo, que queremos lançar em breve.

O que seria esse centro de empreendedorismo?
Queremos criar um espaço dentro da Fábrica Social para estimular o empreendedorismo entre nossos alunos e outros pequenos produtores. Vamos estimular um processo de economia solidária em que eles poderão planejar seus próprios negócios e vender seus produtos. A ideia é dar toda a consultoria e assessoria necessária, inclusive com a disponibilização de créditos do programa Prospera. Claro que não será permitida a utilização dos insumos da fábrica, mas poderemos abrir o espaço físico para acolher esses pequenos produtores. Queremos conectar os alunos egressos e os atuais com o setor produtivo também. Então, o que faremos é criar uma grande rede de conexão para potencializar a atuação do setor. Por exemplo, vamos supor que a Hering venha para Brasília; ela não vai contratar a Fábrica Social porque somos governo, mas poderá contratar a confecção da dona Maria, que foi aluna da fábrica e que agora está no centro de empreendedores. E aí o governo fez o seu papel – diria que foi até além, porque está ajudando a dona Maria a fazer negócio e ainda vai arrecadar com a produção dela. Ou seja, parte do recurso investido na dona Maria volta com impostos para poder investir na formação de outras pessoas.

O governo está trabalhando para trazer grandes empresas e assim empregar boa parte da mão de obra qualificada pela Fábrica Social?
Com a reformulação do currículo da confecção conseguimos trazer o setor produtivo e todas as indústrias de Brasília da área da confecção, vestuário e moda para perto. Com isso, já conseguimos 300 vagas de estágio só nesse semestre. Ainda estamos buscando parcerias com grandes empresas. Já recebemos visitas de empresários, inclusive marcas internacionais, interessados em ser conectados ao nosso centro empreendedor. Isso para nós é ótimo, porque além de fornecer mais vagas para estágio ainda podemos inserir os pequenos produtores em serviços maiores. Eles poderão ser contratados por grandes empresas para trabalhar em parceria.

Como vocês têm divulgado os trabalhos realizados pelos alunos da Fábrica Social?
Uma das ações estratégicas que fizemos foi um acordo de cooperação com o sindicato das indústrias e a Fibra [Federação das Indústrias de Brasília]. Com isso conseguimos apresentar nossa produção em feiras como a Hair Brasília, em julho passado. Estamos promovendo formas de conectar nossos alunos aos empresários e à comunidade. Porque assim ele mostra o que sabe fazer, na prática, e passa a ter referência para ser contratado para algum serviço. Para o vestuário também estamos elaborando um calendário de desfiles junto com setor produtivo. No dia 28 de agosto teremos o primeiro deles, que será realizado nas instalações do IFB [Instituto Federal de Brasília].

Fonte: Agência Brasília – Foto: Paulo H. Carvalho/Agência Brasília

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