JOSÉ DOS REIS DE OLIVEIRA/“Ouvidoria é uma ferramenta importantíssima de gestão pública”
Em entrevista à Agência Brasília, ouvidor-geral destaca importância das manifestações populares na construção de políticas públicas e comenta decreto que reformula a atuação das ouvidorias do DF
Formado em administração de empresas pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), o gestor em políticas públicas e gestão governamental José dos Reis de Oliveira é ouvidor-geral do Distrito Federal desde 2015. O ingresso no GDF aconteceu em 2006 por meio de concurso público. Mas foi em 2011, quando transferido para a Corregedoria-Geral do DF, que o trabalho dele se destacou. Reis liderou a implementação de projetos ousados, como o reconhecido Sistema de Ouvidoria do Distrito Federal (Ouvi-DF) e o programa Carta de Serviços ao Cidadão, instituído em todos os órgãos e entidades do executivo local.
Foi Reis quem reestruturou a Rede de Ouvidorias do DF, coordenou a equipe que criou o Manual de Atendimento de Ouvidoria e instituiu o prêmio Melhores Práticas de Ouvidoria do Governo do Distrito Federal, como forma de reconhecer e estimular um trabalho de excelência no atendimento ao cidadão. “Não tenho dúvidas de que a ouvidoria é uma grande aliada para a construção de políticas públicas eficientes”, avalia.
Em entrevista à Agência Brasília, Reis explica os avanços na área de atendimento ao cidadão com o decreto sancionado nesta quarta-feira (20) e crava: “A ouvidoria é uma ferramenta importantíssima de gestão pública”.
O que a população pode buscar e encontrar numa ouvidoria de governo?
A ouvidoria é a porta de acesso da população ao governo. Nela, a população solicita a prestação de serviços, registra denúncias, reclamações. Você encontra de tudo, de solicitação de serviços, tapa-buracos, poda de árvore a denúncias de irregularidades, falta de médicos, de servidores – [e até] denúncias quando há invasões de área pública, ou privada, inclusive. [Também se denuncia a] falta de fiscalização em áreas urbanas [e são feitos] elogios. Por incrível que pareça, a ouvidoria vive um paradoxo. A Saúde, por exemplo, é o órgão com maior número de reclamações, mas também é o mais elogiado.
O canal de ouvidoria é fragmentado por órgão?
Não. É um canal único para todos. Qualquer sítio eletrônico do governo, seja de uma secretaria ou mesmo uma empresa pública, tem disponível o ícone para acesso ao sistema Ouvi-DF. Nele, é feito o registro da manifestação. O cidadão especifica o tipo – se é reclamação, elogio, solicitação, denúncia ou sugestão. Em seguida, registra a manifestação. É algo bem simples e intuitivo. Temos uma central que faz esse controle inicial e distribuímos para as ouvidorias do órgão responsável pela área de interesse do cidadão demandante. Daqui a coordenação de ouvidorias e a de atendimento ao cidadão fazem o acompanhamento das manifestações.
Então, o papel da Ouvidoria-Geral é de controle de qualidade?
Na verdade, a nós cabe a coordenação e acompanhamento de toda a rede de ouvidorias, composta por 91 ouvidores. Cada órgão da administração direta e indireta deve ter um ouvidor responsável. Atualmente estamos com apenas 82, que são os ouvidores nomeados e em pleno exercício das atividades. Ainda precisamos nomear o restante, mas a maioria já está trabalhando. Aqui, capacitamos todas as equipes de ouvidoria e damos suporte para o serviço deles. No governo passado, foram mais de 4 mil pessoas capacitadas. Se o pessoal tem algum problema, liga para a gente e orientamos como proceder. Fazemos visitas técnicas para verificar as condições de trabalho. Expedimos alguns normativos com o formato de como tratar as demandas de ouvidoria, o modelo de resposta cidadã. Explicamos a importância de atender à Lei de Acesso à Informação (LAI). Tudo isso zelando pela a qualidade no atendimento ao cidadão.
“Precisamos avançar mais, porque as ouvidorias são o canal direto do governo com a população. O cidadão é nosso consultor gratuito”
A população conhece a Lei de Acesso à Informação (LAI)?
Aparentemente, sim. Mas acredito que [essa lei] ainda precisa ser mais divulgada, principalmente em relação à população carente. Afirmo isso pela quantidade e pela especificidade das demandas. Mas é claro que isso tem ganhado uma ampla divulgação, ano após ano. Hoje, em todos os sítios eletrônicos do governo, existem ícones linkados para páginas específicas, que explicam tudo da LAI e também do decreto de regulamentação. Por sua vez, a Subcontroladoria de Transparência, todo ano, avalia todos os órgãos e dá uma premiação, o Índice de Transparência Ativo, para aqueles com melhor desempenho. É uma maneira de estimular que todos os sites do governo busquem publicar de maneira clara, explícita e acessível o trâmite dos processos, os pagamentos de fornecedores, os gastos com servidores, com compras, enfim, todas suas as atividades. No ano passado, 47 órgãos receberam essa premiação.
O cidadão de hoje é mais exigente que há cinco anos?
A cada dia ele fica mais exigente – principalmente aqueles cidadãos que utilizam o sistema informatizado de ouvidoria. Não adianta falar: “olha, a gente está fazendo um cronograma para tapar os buracos e vamos passar na sua cidade em 30 dias”. Ele quer o local, dia e hora em que o serviço será prestado. E, se der 30 dias do registro e a solicitação não foi atendida, o cidadão recorre a outra instância.
Qual o perfil dos cidadãos que procuram pelos serviços da ouvidoria?
Quando alguém busca o sistema de ouvidoria, precisa fornecer alguns dados para que possamos acolher a demanda, seja ela reclamação, sugestão, elogio ou até denúncia. Algumas dessas informações são campos obrigatórios que precisam ser preenchidos. Pedimos idade, renda, local de moradia, informações. Por exemplo, quem mais reclama sobre o Cras [Centro de Referência de Assistência Social] é tal perfil, que está quadrado em tal faixa salarial e mora em tal região administrativa. Assim, a Sedest [Secretaria de Desenvolvimento Social] pode utilizar essas informações visando construir soluções para o problema levantado pela população.
Esses dados já foram utilizados em alguma medida importante de governo?
Sim. Para a construção do projeto da Fábrica Social, por exemplo. Mas precisamos avançar mais, porque as ouvidorias são o canal direto do governo com a população. O cidadão é nosso consultor gratuito. Ele sabe onde está o problema. Às vezes, sabe até como resolver e aponta soluções. Eu costumo dizer que as demandas de ouvidoria são muito importantes para nortear o trabalho do governo. Um exemplo simples: a Novacap pode, apenas com base nas reclamações de ouvidoria, fazer um planejamento para a Operação Tapa-Buraco. Basta pegar o mapa de calor e verificar onde a população está reclamando mais. Nosso sistema é todo georreferenciado.
“Não tenho dúvidas de que a ouvidoria é uma grande aliada para a construção de políticas públicas eficientes”
A ouvidoria, quando identifica um fluxo maior de reclamações em determinado órgão, tem autonomia para tomada de alguma medida?
Essa é uma luta diária com os gestores, porque o sistema de ouvidoria é uma ferramenta importantíssima de gestão. Não tenho dúvidas de que a ouvidoria é uma grande aliada para a construção de políticas públicas eficientes. Nela encontramos um relatório de situação das reclamações, elogios e solicitações ao órgão. Mostra os assuntos tratados, se foram resolvidos ou não, qual a maior demanda, o perfil dos demandantes, a região. Tudo pode ser filtrado e segmentado. Infelizmente, muitas vezes, a gente não conseguia fazer esse conteúdo chegar ao gestor. Mas o governador Ibaneis já identificou a importância desse canal de contato direto com a população e, por isso, vai trabalhar pelo empoderamento das ouvidorias do DF. Hoje [quarta-feira, 20), foi publicado o Decreto nº 39.723, que altera a dinâmica. A partir de agora, os gestores terão de priorizar as demandas de ouvidoria e a Controladoria-Geral vai começar a cobrar as respostas, podendo inclusive utilizar-se de critérios para apurar responsabilidades.
Como é o processo de seleção dos ouvidores do GDF?
Até hoje, o processo de escolha era totalmente gerenciado pelo gestor do órgão, que indicava o nome de um servidor efetivo para ocupar o cargo. Agora, com o decreto, essa indicação será feita pelo controlador-geral, que vai seguir uma série de critérios com objetivo de aperfeiçoar o perfil dos ocupantes desses cargos, porque, quando o cidadão busca o governo, na maioria das vezes, a primeira pessoa com quem ele fala nos órgãos é o ouvidor.
Já chegou, por meio da ouvidoria, alguma denúncia mais grave que tenha se desdobrado em uma investigação policial ou mesmo em processo administrativo?
Sim. Várias. Para você ter uma ideia, a própria Operação Trickster (fraudes na bilhetagem eletrônica do transporte público) começou a partir de uma denúncia registrada aqui mesmo, na Ouvidoria-Geral. No caso da Trickster, o governo perdia por semana mais de R$ 500 mil. Sempre que recebemos essas denúncias maiores e vemos a gravidade – porque elas chegam bem-fundamentadas –, encaminhamos logo para a Polícia Civil, outras para o Ministério Público ou para o Tribunal de Contas.
Qual o tempo médio de resposta das ouvidorias do DF?
Hoje, o tempo médio de conclusão da demanda é de dez dias, o que é excelente. Porque veja: segundo a lei, nós temos 20 dias para responder ao cidadão. No caso de denúncias, são 20 dias prorrogáveis por mais 20.
Fonte: Agência Brasília – Foto: Divulgação/Agência Brasília