MACACO NÃO OLHA PARA O RABO

 

Miguel Lucena*

 

O eleitor já encosta no candidato ou pré-candidato pedindo. “Eu quero um particular com o senhor”, começa assim a conversa sedutora. “Não sendo o que eu estou pensando, pode pedir”, já vou me encostando na parede com receio de estar sendo assediado sexualmente.

Uma das coisas mais difíceis é fazer política nos dias atuais. Antes, muitos se mobilizavam em torno de ideais. Do escombros e desilusões que ficaram pelo caminho pós-democratização, com a esquerda reavivando as velhas práticas fisiológicas dos coronéis do sertão e dos Adhemares de Barros da vida, restou um eleitorado majoritariamente interesseiro, invertebrado, viciado, corrupto e comprado.

Ninguém tem mais vergonha de sair pedindo as coisas. Antigamente, os candidatos fisiológicos davam óculos e dentaduras, pagavam consultas, compravam remédios e cesta básica. Hoje, além de tudo isso, pede-se claramente dinheiro vivo.

Os partidos nem escondem mais que o jogo é para quem tem dinheiro. O financiamento público de campanha é uma farsa, porquanto as legendas vão usá-lo da forma que melhor lhes aprouver.

O eleitor já encosta no candidato ou pré-candidato pedindo. “Eu quero um particular com o senhor”, começa assim a conversa sedutora. “Não sendo o que eu estou pensando, pode pedir”, já vou me encostando na parede com receio de estar sendo assediado sexualmente.

Nem os movimentos sociais escapam.  Criaram institutos e movimentos de tudo quanto é tipo, mas sem condições de se sustentar sozinhos. E haja pedidos. Muita gente quer aparecer, mas sempre às custas dos outros.

Uma entidade cujos sócios não contribuem nem deveria existir. Igrejas e terreiros bem frequentados deveriam, pelo menos, arrecadar os valores mínimos para pagar suas contas de água e luz, mas ocorre que convidam o candidato para levar sua mensagem e já lhe apresentam, em seguida, uma maçaroca de recibos em atraso há mais de ano, sem que os fiéis tivessem a generosidade de contribuir com o mínimo para a obra.

Cinquenta mil gays resolvem demonstrar seu orgulho pelas ruas de Brasília, mas nenhum põe a mão no bolso para ajudar o movimento. O coitado de um amigo quase tem um infarto esta semana para assegurar a realização da parada do Guará.

Cabos eleitorais profissionais batem cabeça pelas quadras de Brasília, cada um vendendo dificuldade para colher facilidade. São lideranças importantes, segundo eles, que reúnem centenas à sua volta,  mas a maioria não tem sequer o apoio do família.

No fim, todos se juntam para falar mal dos políticos, porque macaco nunca olha para o próprio rabo.

 

*Miguel Lucena é Delegado da Polícia Civil do DF, jornalista, escritor e articulista do Brasília In Foco News

 

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