O Estado terceiriza para si mesmo

Por Percival Puggina (*)

Leio no site Jota

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), abriu uma terceira via no julgamento do piso da enfermagem. Na madrugada desta sexta-feira (23/6), ao devolver a vista do processo, o ministro acompanhou em parte o voto conjunto do relator Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes, e inovou ao propor que o piso deve ser regionalizado para funcionários celetistas. Na tarde desta sexta-feira (23/6), Toffoli foi acompanhado em sua proposta pelo ministro Alexandre de Moraes, saiba mais.

Comento

Vocês perceberam o que está acontecendo? O assunto é “piso salarial da enfermagem”. A invenção do piso salarial é um achado na cartola dos demagogos. Desde que saiu a primeira, as categorias funcionais com prestígio recorrem ao Congresso Nacional para que este fixe um determinado valor como mínimo a lhes ser pago.

O parlamento discute, ouve as partes, e delibera. Só que não. No Brasil, em todo canto, de um modo quase religioso, onde dois ou mais estiverem reunidos, está, também a espada do Judiciário. Assim, o projeto votado pelo Congresso acaba nas mãos do Supremo, um colegiado formado, neste momento, por 10 membros sem voto popular algum.

Na matéria, vê-se que, de momento, quatro votos foram dados e há três entendimentos diferentes. Quase se pode dizer que, até agora, de cada cabeça saiu uma sentença. E o assunto vai ser resolvido assim?

Já vi tanto disso na vida! Em legislativos estaduais e municipais, o parlamento delibera, mas lava as mãos e terceiriza o assunto para a sanção ou veto do executivo. No Congresso, uma Casa vota, mas terceiriza o tema para a decisão da outra; muitas vezes, aprova aqui algo inviável sabendo que será rejeitado ali, ou vetado acolá.

O ativismo judicial faz esse poder funcionar como uma esponja de prerrogativas. Nossos magistrados e ministros parecem que não aprenderam a dizer: “Isso não é conosco!”. O resultado é hipertrofia de seu poder, com um verdadeiro carretel de consequências.

Para os fins que me levam a escrever este artigo, não interessa saber se a lei do piso da enfermagem pelo Congresso é boa ou má. Estou reprovando a existência desse tipo de lei e o modo como as coisas são feitas. Se o piso da enfermagem deve ser regionalizado, como sugerem os ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, qual o motivo para que as outras duas dezenas ou mais de pisos existentes também não o sejam?

(*) Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

*Artigo de responsabilidade do autor.

Fonte: Site puggina.org, gentilmente disponibilizou este artigo para o Brasília In Foco News

Foto: Reprodução

Deixe seu comentário