O perigoso momento do Brasil
Os homens críticos, razoáveis e crentes na razão incorrem num erro de natureza utópica: a crença de que a humanidade como um todo compreende a importância da equidade, da justiça, da cooperação entre os seres humanos, em suma, daquilo que nos recomenda uma mínima inteligência construtiva.
Assim pensava John Mainard Keynes quando, além de professor aprofundado nas teses acadêmicas, era um alto funcionário do governo britânico.
Decepcionou-se profundamente em Versalhes, embora tenha sido o mais brilhante dos conferencistas.
Em 1919, era um homem decepcionado. A incapacidade de o presidente Wilson, dos Estados Unidos, de dar forma sensata, racional e equilibrada aos procedimentos indenizatórios emergentes dos danos da Primeira Guerra Mundial, e a falta de bom senso dos aliados, fazia-o retornar dos arredores de Paris desprovido do que crera – a racionalidade das sociedades humanas.
Melancolicamente, Keines admitiu que sonhou com o impossível. E que a Segunda Guerra Mundial era inevitável…
A depressão, a agitação política radical entre as guerras (agitação muito similar à que vivemos neste momento histórico brasileiro), a inevitabilidade, em consequência, do segundo conflito global, foram elementos que conduziram Keines a uma dolorosa autocrítica: ele sempre atribuíra “uma racionalidade irreal aos sentimentos e ao comportamento das outras pessoas (e, sem dúvida, também aos meus próprios)” e que “a atribuição de racionalidade à natureza humana (…) ignorava certas fontes poderosas e perniciosas dos sentimentos”. A guerra havia liberado essas fontes e emoções, a maioria das quais hostilizava, em vez de favorecer, a civilização e o progresso.
Os sentimentos e emoções desconstrutivos despertaram o ódio e as emoções pérfidas dos brasileiros desde as primeiras manifestações de rua no governo Dilma Roussef; o impeachment, no fim não foi uma contenção para que os governantes voltassem aos trilhos da lei. Os processos de corrupção paradoxalmente não melhoraram o “ethos” dos brasileiros; o racha da juventude em grupos opostos de manifestações retaliativas até este momento não se revelaram como confrontos físicos. Estão, porém, incubados.
Mais grave, o governo instalado em Brasília, ao invés de estimular a racionalidade prática (utópica, segundo as frustrações de Keines que refugiou-se nos estudos acadêmicos), “mutatis mutandis”, as mesmas políticas emocionais e temerárias que foram incrustadas nos nervos, não nos cérebros, das populações que viveram após o fracassado Tratado de Versalhes. Tal emotividade destruidora “é fonte poderosa e perniciosa dos sentimentos” de grande partes dos brasileiros de 2019. É dever dos homens que não carregam o fardo natural da intolerância (uma minoria) – tentar detê-la, mas nenhum efeito emana do enclausuramento acadêmico pelo qual optou o gênio que soube prever a eclosão de uma nova guerra mundial.
Amadeu Garrido de Paula, é Advogado, sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados.
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Fonte: De León Comunicações – São Paulo/SP – Foto: Reprodução