Pedido de vista adia decisão sobre mudança na Lei Antidrogas
Relator da proposta, o senador Styvenson Valentim (Pode-RN) acolheu o texto proveniente da Câmara dos Deputados
Ficou para o dia 8 de maio a votação do projeto que torna mais rígida a Lei Antidrogas (Lei 11.343/2006) nas comissões de Assuntos Sociais (CAS) e Assuntos Econômicos (CAE). Além de endurecer as penas para traficantes, de 5 anos para até 15 anos de prisão, o PLC 37/2013 também regulamenta a internação involuntária do dependente, entre outros temas.
Um pedido de vista coletivo mostrou a falta de consenso sobre a votação da proposta da Câmara, que espera definição do Senado há seis anos. Na reunião conjunta, os senadores apontaram a liberação tardia do relatório do senador Styvenson Valentim (Pode-RN), que pelo Regimento Interno deveria ocorrer em até 48 horas antes da reunião, mas só foi entregue na véspera.
No relatório, Styvenson defende o texto da forma como veio da Câmara dos Deputados, para evitar que emendas e o substitutivo já aprovado na CCJ levem a proposta a retornar à análise dos deputados.
— Mesmo reconhecendo que algumas alterações propostas pelas duas comissões são meritórias, o ganho para a sociedade é proporcionalmente pequeno diante do tempo que levaria para a Câmara voltar a votar esse projeto. Temos urgência para reduzir a superlotação dos presídios por pequenos traficantes e concentrar esforços em prender os grandes — afirmou o relator.
O argumento de Styvenson não convenceu Fabiano Contarato (Rede-ES). Ele pediu serenidade e equilíbrio emocional no tratamento da matéria, apontando a subjetividade na definição de quem seria consumidor/usuário e quem seria traficante. Identificar como usuário aquele que estiver com droga suficiente para até cinco dias de uso seria, para ele, um critério “extremamente subjetivo”.
Contarato também questionou o aumento da pena do tráfico de entorpecente [artigo 33 da Lei Antidrogas], que subiria de oito para 15 anos. Para o senador, isso proporcionalmente torna a pena desse crime maior que a do próprio homicídio. Outro ponto reprovado por ele é a possibilidade de internação compulsória.
— Medidas radicais de abstinência têm efeitos na capacidade mental. Não podemos votar esse projeto da noite para o dia — disse Contarato.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) reforçou o argumento de Contarato, lembrando que 62% das mulheres presas no Brasil são “mulas”, como são apelidados os traficantes de pequenas quantidades de drogas.
— Por outro lado, o filho de uma desembargadora foi preso com 10 kg de cocaína no carro e nada aconteceu a ele. O bom direito é quase uma equação matemática. O problema desse projeto é que ele não quantifica o que é ou não é tráfico, isso está em aberto — afirmou.
O senador Humberto Costa (PT-PE) também reprovou a tentativa de aprovar o projeto sem prazo para a leitura do relatório e sem um debate mais profundo.
— Não sei porque razão querem aprovar a toque de caixa. Tem senadores novos aqui, são muitos, eles não participaram dos debates anteriores — afirmou Humberto Costa.
Supremo
O prazo exíguo seria, segundo senadores que defendiam a votação do projeto nesta quarta (24), em razão da previsão de julgamento do tema pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 5 de junho. Três dos 11 ministros do STF já votaram pela descriminalização do consumo de drogas. Como o tribunal reconheceu a repercussão geral, o que for decidido pelo STF valerá para todas as ações judiciais sobre o tema.
O senador Eduardo Girão (Pode-CE) foi um dos que defendeu celeridade na tramitação do projeto e o relatório de Styvenson.
— Vamos avançar antes que o STF novamente tire nossa prerrogativa e libere as drogas no Brasil, o que seria um grande retrocesso. Isso é tão verdade que os países que fizeram isso estão voltando atrás por causa da evasão escolar, do aumento de criminalidade. O Brasil não deve tolerar isso — afirmou Girão.
Para a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), um maior rigor na política antidrogas é prioridade. Ela argumentou que o sistema carcerário tem de 70% a 80% dos réus condenados por crimes relacionados com drogas, o que demonstra o tamanho do problema vivido pelo país. Para ela, assim como para os senadores Omar Aziz (PSD-AM), Esperidião Amin (PP-SC) e Lasier Martins (Pode-RS), já não há mais por que esperar para votar a proposta, sob o risco de o STF legislar, ao invés do Congresso.
— Houve acordo de líderes para apreciação do projeto no Plenário antes do dia 15 de abril, desde que houvesse reunião de comissão temática. O projeto é bem conhecido e muito debatido, foi discutido na Câmara, vários de nós vimos ele lá — explicou Amin.
Mérito
O PLC 37/2013 muda não só na Lei de Drogas (11.343, de 2006), mas outras 12 leis. Ao todo, sete temas são abordados pelo projeto: estruturação do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad); formulação e acompanhamento de políticas sobre entorpecentes; atividades de prevenção ao uso de drogas; atenção à saúde dos usuários ou dependentes de drogas e reinserção social e econômica; comunidades terapêuticas acolhedoras; aspectos penais e processuais penais; e mecanismos de financiamento das políticas sobre drogas.
— Ela cria a hipótese de redução de pena quando o porte da droga for de menor poder ofensivo, mas agrava a pena para traficantes, além de prever alienação de objetos usados no tráfico de drogas, como veículos, ferramentas e instrumentos — disse Styvenson.
O relator comentou que o projeto modifica o artigo 33 da Lei Antidrogas, que permite a redução de pena não só quando o agente for primário e não participar de organização criminosa, mas quando o juiz julgar que as circunstâncias do fato e a quantidade da droga apreendida demonstram menor potencial lesivo da conduta.
— O juiz deverá avaliar o potencial ofensivo da conduta, cabendo a ele decidir caso a caso. O grande mérito do projeto é trazer hoje o conceito de comunidade terapêutica, olhar para quem cuida do dependente. Ele não aumenta a punição para o usuário — afirmou o relator.
A proposta também torna obrigatória a elaboração do plano individual de tratamento.
Reinserção
Styvenson ressaltou as ações de reinserção econômica e social dos assistidos. A proposta abre a possibilidade de o contribuinte deduzir até 30% de Imposto de Renda por doações para construção e manutenção de entidades destinadas a recuperar usuários de drogas. Também há a previsão de incentivos fiscais para doações a fundos e políticas antidrogas, da mesma forma que hoje é previsto para doações de incentivo à cultura e para cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), limitada a 6% do imposto devido.
Styvenson também aprova a reserva de 3% das vagas em licitações de obras públicas com mais de 30 postos de trabalho a serem preenchidas por ex-dependentes em fase de reinserção.
— O PLC é condizente com as melhores experiências internacionais. Deve-se tratar a questão das drogas como de saúde pública, prevendo a recuperação e reinserção do dependente e usuário, mas prevendo punição rigorosa aos traficantes e do crime organizado — argumentou.
Maconha
O substitutivo aprovado na CCJ, que é rejeitado por Styvenson, inclui dispositivos que permitem a importação de derivados e produtos à base de Cannabis para uso terapêutico e a criação de um limite mínimo de porte de drogas para diferenciar usuário comum de traficante.
Esse ponto foi defendido pela senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) na reunião conjunta. Para ela, uma nova lei antidrogas precisa ter a previsão do uso terapêutico da Cannabis, por exemplo. Mara, que é tetraplégica, é usuária do Canabidiol, droga terapêutica elaborada a partir da planta e que éimportada por ela com autorização a Anvisa.
A senadora disse que, embora a discussão do projeto seja antiga e haja urgência, as necessidades e expectativas da população mudaram, e os parlamentares dessa nova legislatura devem debater o tema.
Depois de votado o relatório de Styvenson na CAS e na CAE, o PLC 37/2013 segue para análise da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). De lá, todos os pareceres das comissões seguirão para a votação no Plenário do Senado. Caso o parecer escolhido seja diferente do texto da Câmara, como seria o caso do substitutivo da CCJ, a matéria voltará para análise dos deputados. Se o Senado mantiver o texto aprovado por unanimidade pelos deputados, a matéria seguirá para sanção presidencial.
Fonte: Agência Senado – Foto: Pedro França/Agência Senado