Presidente de rede de fast food aprendeu inglês em sete dias
Para executivo, oportunidades precisam ser abraçadas, mesmo que às vezes pareçam impossíveis de serem alcançadas
“E como está seu inglês?”, perguntou o recrutador ao jovem de 25 anos que concorria a uma das três vagas de trainee da recém-chegada divisão de restaurantes da PepsiCo no Brasil. O ano era 1993. Paulo Camargo tinha acabado de pedir baixa do serviço militar, onde ingressara com 18 anos, e não falava uma palavra na língua estrangeira.
“Eu disse para ele me dar uma semana que iria me preparar para aquilo e ele, meio atônito, aceitou. Juntei todo o dinheiro que tinha guardado enquanto estava no Exército, paguei um professor e passei a estudar 15 horas por dia”, lembra o presidente da divisão brasileira do McDonald’s, controlada pela Arcos Dorados, maior franquia independente da marca no mundo. “Falei o suficiente para passar, mas consegui a vaga pelo esforço que fiz, não pelo inglês que falei.”
Camargo usa essa passagem de sua vida para ilustrar a maneira como encara o mundo corporativo. Para ele, oportunidades precisam ser abraçadas, mesmo que às vezes pareçam impossíveis de serem alcançadas. “Se não fosse assim, não teria saído do lugar”, diz.
Criado no subúrbio de Carapicuíba, na Grande São Paulo, é o filho caçula da costureira Delfina e do técnico em eletrônica Pedro, um casal que não terminou o primeiro grau escolar. Assim como os quatro irmãos, nasceu em Osasco e trabalhou desde os dez anos com os pais para ajudar no sustento da família. Fazia de tudo um pouco: carregava caixas de válvula, anotava pedidos, limpava banheiros.
Foi só quando entrou no Exército, aos 18 anos, que teve o primeiro contato com universitários, pessoas que falavam outras línguas, donas de sonhos maiores. Saiu de lá anos depois como major graduado, direto para a vaga de trainee da PepsiCo.
Depois de ter morado no Chile pela multinacional e, entre outras experiências, presidir na Espanha uma companhia de aço, Camargo recebeu a proposta de voltar ao país. Desta vez, o inglês era o de menos: ele seria vice-presidente de operações da Arcos Dorados no Brasil.
“O curioso é que tive 1,5 ano de treinamento em várias áreas antes de assumir o cargo. Até voltei a limpar mesas e banheiros, só que das lanchonetes”, conta.
Descrito por ex-colegas de PepsiCo como detalhista e observador, Paulo tratou de arranjar um amigo inseparável desde o primeiro dia de Arcos Dorados. Levava consigo um caderno de bolso, onde anotava tudo, das sutilezas que julgava inapropriadas às modificações que um dia iria sugerir.
“Ele é daqueles que se atentam e valorizam as pequenas trocas de generosidade entre os colegas. Somos amigos há 25 anos porque um dia ele perdeu os documentos e eu o ajudei a bloquear os cartões”, diz Wagner Luiz Wey, que trabalhou com Camargo em 1993.
Após quatro anos e muitas páginas rabiscadas, Camargo assumiu o comando do McDonald’s Brasil, em 2015, quando a rede amargava anos de vendas estagnadas –e levou os pequenos cuidados que fizeram diferença na gestão.
Uma das primeiras decisões saiu das anotações do caderno: mudar o uniforme dos atendentes, o mesmo há oito anos. “A empresa entrava em um novo momento, era preciso roupa nova”, diz.
Convocou uma reunião com diretores e propôs a modificação. Soube, então, que os trâmites -sugestão, testes e aprovação financeira na matriz- levariam dois anos. Espantado, perguntou: “Vocês não conhecem a 25 de Março [rua comercial popular da capital paulista]?”.
Sugeriu e a direção aprovou que, a baixo custo, os funcionários usassem uniformes provisórios até a chegada dos definitivos. A decisão foi tomada em duas semanas.
Nas visitas aos restaurantes, quebrou outra regra. Dispensou formalidades e passou a tirar selfie com os atendentes para motivar as equipes.
Casado e pai de dois meninos, um de 13 e outro de 9 anos, Paulo afirma que os filhos comem os lanches da rede três vezes por semana, a mesma frequência que ele. E foi em uma dessas idas à lanchonete que ficou incomodado com a insistência da “batata acompanha?” repetida pela atendente de um drivethru.
Desceu do carro e orientou a caixa a parar de falar como um robô. O atendimento espontâneo virou a nova regra, assim como a mudança de cardápio com itens para todos os bolsos e reformas de lojas.
Aos poucos, os resultados apareceram. O Ebitda, indicador de eficiência operacional, subiu 25% em 2017, quatro vezes mais que as vendas. A rotatividade de pessoal, um clássico da rede, caiu pela metade.
Camargo diz que a receita de uma chefia deve ser simples: cercar-se de pessoas com as habilidades que ele não tem e incentivar o melhor delas. Com informações da Folhapress.
Fonte: Notícias Ao Minuto
Foto: Fernando Pereira / SECOM