Quanto tempo uma vida em risco pode esperar?

Por Maira Caleffi (*)

Conviver com o diagnóstico de câncer não é tarefa fácil. Assim que uma pessoa descobre a doença, o ponteiro do relógio dispara: a busca por tratamentos e medicações que possam salvá-la torna-se uma prioridade e uma corrida contra o tempo.

O acesso a medicamentos essenciais para a assistência às pacientes com câncer de mama sempre foi pauta de reivindicações constantes da FEMAMA. Uma das nossas conquistas é a incorporação do trastuzumabe e pertuzumabe aos sistemas público e privado de saúde para tratamento do câncer de mama metastático HER2+, estágio mais avançado da doença. Após terem sidos disponibilizados, a FEMAMA – junto às ONGs associadas – fiscaliza e pressiona para que seja feita a correta distribuição aos pacientes, o que ainda não está acontecendo.

A burocracia por trás da incorporação de medicamentos também é uma discussão antiga. Mesmo após a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), as drogas e terapias percorrem um longo e demorado caminho até que sejam efetivamente disponibilizadas tanto pelo Sistema Único de Saúde (SUS), quanto pela rede privada, regulada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Atualmente, o rol de procedimentos e medicações da ANS, que define a oferta obrigatória dos planos de saúde, é publicado de dois em dois anos. São 24 meses de extensas reuniões e reivindicações até que os pacientes possam ter acesso a terapias capazes de mudar seu prognóstico, mesmo que já tenham sido aprovadas pela ANVISA há muito tempo.

Encontramos, recentemente, mais um entrave: em dezembro de 2018, foi publicada a resolução normativa nº 439 da ANS, que aprimora o processo de incorporação de procedimentos. Por conta da atualização, o cronograma foi alterado e o próximo rol entrará em vigor, em caráter de exceção, apenas em 2021. Ou seja: pacientes que estão vivendo agora a dura realidade do câncer de mama vão esperar três anos desde a publicação do último rol para que tratamentos mais assertivos passem a ser oferecidos pelos planos de saúde.

As pessoas mais afetadas pela demora na inclusão de medicações são aquelas que estão no estágio mais avançado da doença, conhecido como metastático, para quem a maioria dos tratamentos inovadores se destinam. Essas vidas lutam contra o relógio: elas não têm tempo para esperar. O atraso mobilizado por conta da publicação da normativa atualizada é uma questão burocrática, que prejudica mais do que beneficia pessoas que estão enfrentando a doença.

É consenso entre entidades médicas e pacientes que este prazo é inaceitável. Temos que nos mobilizar para assegurar que todos tenham acesso àquilo que é um direito básico, garantido pela Constituição Federal: a saúde. Tratamentos mais efetivos dão às pessoas uma chance de viver mais, com maior qualidade.

O câncer não aguarda, pacientemente, até que essas medicações ultrapassem tantas barreiras. A batalha contra a doença já é complicada o suficiente para que entraves meramente burocráticos impeçam que vidas sejam salvas.

*Maira Caleffi é presidente voluntária da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (FEMAMA) e Chefe do Serviço de Mastologia do Hospital Moinhos de Vento

Fonte: FEMAMA – Foto: Reprodução

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