Quem é Ibaneis, o candidato que partiu do nada e conquistou 630 mil votos em 45 dias
O brasiliense começou a trabalhar aos 11 anos como empacotador, vendeu hortaliças, peixe, remédios e construiu patrimônio na advocacia
Em 45 dias de campanha, Brasília descobriu Ibaneis Rocha (MDB). Até então desconhecido da maioria dos brasilienses, ele teve ascensão meteórica na corrida ao Buriti. Saltou de 2% nas primeiras pesquisas para 41,97% dos votos, em um cenário com 11 candidatos. Alcançou, assim, a confiança de 634 mil eleitores, um feito extraordinário.
Personagens experimentados na vida pública às vezes levam anos até conseguir marca numericamente expressiva. Um exemplo: José Antônio Reguffe (sem partido) tentou se eleger deputado distrital durante três mandatos. Quanto finalmente conquistou assento na Câmara Legislativa, em 2006, obteve no pleito 25.805 votos. Daí, subiu degraus, passando a deputado federal, até conquistar vaga de senador com 821.715 apoiadores. Performance obtida após 20 anos disputando eleições.
Ibaneis Rocha debuta como político. É a primeira eleição geral que participa. Mesmo estreante, amealhou milhares de votos na capital federal, abrindo abismo até o segundo colocado, o governador Rodrigo Rollemberg. Postulante à reeleição pelo PSB, o chefe do Executivo somou 210 mil votos, três vezes menos que seu adversário.
Mas, afinal, quem é o homem que abateu nove oponentes, vários deles velhos conhecidos na política candanga, e expôs o desempenho murcho de seu agora adversário no segundo turno?
Origem da fortuna
Ibaneis é o tipo de gente que experimentou a dor e a delícia do trabalho. Foi empacotador de supermercado aos 11 anos. E antes de chegar aos 40 (hoje, ele tem 47 anos), já era milionário. Morou no Guará boa parte de sua infância. Mas suas correspondências, agora, chegam à QI 17 do Lago Sul.
Berço de ouro ele conheceu já adulto, porque em sua Certidão de Nascimento consta o Hospital de Base. Viveu duas realidades abissais: seu álbum de infância divide recordações entre a cidade de Corrente, no extremo sul do Piauí, para onde se mudou aos 8 anos com a família; e a capital do país. Retornou a Brasília para cursar o segundo ano do ensino médio.
O tudo ou nada faz parte da vida de Ibaneis desde sempre. Quando decidiu se lançar na vida pública, sabia que, apesar de não ter qualquer tradição política, tinha chances de pavimentar um caminho, como fez em várias outras ocasiões. Seria, talvez, mais uma prova de persistência.
Certa vez, o advogado fez plantão na antessala de um juiz por vários dias até conseguir o que queria: uma liminar que liberou o pagamento da recomposição salarial de servidores públicos em face da conversão do cruzeiro real na chamada URV, moeda de transição para o Plano Real.
Causas de servidores
Intrigado com a presença insistente do defensor em plena véspera de feriado, o magistrado o abordou e Ibaneis foi direto ao ponto, como costuma fazer até hoje: “Estou aqui aguardando a liminar que o senhor me prometeu. O Tribunal fecha amanhã e eles estão com o dinheiro para pagar os servidores. Para o senhor isso pode não fazer diferença, mas, para mim, é a diferença entre ser rico e pobre”.
As causas de interesse de servidores explicam a fortuna que o advogado reuniu em 25 anos de exercício da profissão. Atualmente, seu escritório representa 80 mil ações envolvendo trabalhadores da iniciativa pública.
Na vitrine das eleições, Ibaneis precisou, recentemente, explicar ação que ele e seu escritório de advocacia respondem por superfaturamento e dano ao erário no recebimento de honorários referentes à liberação de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) para a prefeitura de Jacobina na Bahia.
Seus adversários bem que tentaram desqualificar o caráter do oponente por ele não demonstrar incômodo em receber, por pagamento, dinheiro destinado à educação. Mas Ibaneis mostrou-se seguro em defender a origem de seu patrimônio. “Trabalhei a vida toda, fui contratado de forma lícita. Eles [Ministério Público] têm o direito de entrar com as ações e eu tenho o direito de me defender. Não vejo qualquer problema quanto a isso”, sustentou o advogado.
O mesmo pragmatismo com que conduz a vida profissional, Ibaneis aplica na esfera pessoal. Tem desenvoltura para lidar e até falar de situação que para muitos causaria embaraço. Ele foi casado por mais de 20 anos com Luzineide — com quem tem Caio, 20 anos, e João Pedro, 13. O relacionamento amoroso acabou, mas restou o respeito e a parceria profissional.
“Luzineide é uma mulher de fibra, sensacional. Vivemos juntos durante muitos anos, porém nos separamos. Tenho outro relacionamento, mas desejo a ela muita felicidade”. Ela é sócia-gerente de Ibaneis e administra o patrimônio deles.
Atualmente, Ibaneis vive com Mayara, grávida de Mateus: “Tenho uma vida nova, em breve serei pai de mais um garoto. Quando terminar o divórcio, me casarei. Quero, pelo menos, mais dois filhos.”
Gosto pelos estudos
Protagonista de uma carreira bem-sucedida, Ibaneis esbanja autoconfiança, qualidade que aos olhos de seus observadores mais críticos confunde-se, por vezes, com arrogância. O patrimônio intelectual que o advogado construiu vem do gosto declarado pelos estudos. Gaba-se de ter sido sempre um aluno exemplar. E de ter respostas para tudo, ainda quando restam dúvidas.
Mesmo ainda inexperiente na advocacia, Ibaneis não deixou o cavalo arriado lhe escapar. Em meados dos anos 1990, seu concunhado disse que precisava de um advogado para defender uma causa do interesse de servidores da associação do Ministério Público do Trabalho (MPT). Na época, 1994, a edição da Medida Provisória nº 560 provocou o aumento da alíquota da Previdência Social.
“Cheguei na salinha da associação e eles perguntaram se eu conhecia da matéria. Disse que era um especialista, mas eu nunca tinha visto aquilo na minha vida. Eles me contrataram, eu fui para a biblioteca do TRF [Tribunal Regional Federal] e estudei tudo sobre Previdência. Peguei desde a Lei Eloy Chaves [base da Previdência Social no Brasil] até as últimas alterações, tudo que se passou, fiz uma petição muito bonita e consegui a liminar suspendendo este aumento de contribuição”, lembra.
Ibaneis multiplicou essa vitória com o auxílio de um catálogo telefônico, numa época em que internet estava surgindo no Brasil. Telefonou de associação em associação oferecendo seus serviços. Aliás, negociar tornou-se uma de suas especialidades. Já vendeu hortaliças, farinha, remédios (foi dono de uma farmácia na 210 Norte) e até peixe que sua mãe mandava do Piauí em caixas de isopor levadas em um Fusca. Agora, o que ele está oferecendo na praça é sua disposição em governar a cidade. Chegou a vez do milionário pedir crédito.
Fonte: Metrópoles
Por Lilian Tahan / Manoela Alcântara
Foto: JP Rodrigues/Especial para o Metrópoles