Remoções de servidores do Base deixam pacientes “órfãos” e agoniados

 

Remanejamento de profissionais para outras unidades de saúde preocupa quem está em tratamento. Sindicatos cobram explicações

Pacientes do Instituto Hospital de Base (IHB), o maior estabelecimento de saúde do Distrito Federal, estão assustados com o remanejamento compulsório de servidores para outras unidades. Eles temem por falta e desencontro de informações, além de descontinuidade no tratamento, o que pode levar à morte em situações mais complexas.

Como a doença não espera, quem faz acompanhamento tem lutado para saber onde, como, quando e por quem serão atendidos com a alteração promovida pelo GDF. Conforme o Metrópoles noticiou, no universo de 1 mil funcionários transferidos – entre médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem, nutricionistas e outros –, 241 foram removidos contra a vontade. Ao mudar a gestão do IHBDF, o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) garantiu manter em seus postos os funcionários públicos da Saúde que fizessem a opção de continuar na unidade, mas a promessa não foi cumprida.

Uma das áreas atingidas é a de hematologia, da qual a servidora pública Ângela Lima dos Santos, 43 anos, necessita de acompanhamento. Há uma década, ela luta contra uma doença falciforme no hospital e, recentemente, viu o trajeto entre o seu trabalho, no Setor Bancário Norte, e o Hospital de Base, ser preenchido pela preocupação. Responsável por cuidar de Ângela, a médica Margarete Daldegan deixou o quadro de funcionários do IHB e foi realocada no Hospital Regional da Asa Norte (Hran).

“É uma agressão ao paciente. Você necessita de todo um cuidado especial com a saúde, chega no setor para fazer o tratamento e não vê a sua médica lá”, lamenta Ângela, sem saber onde será atendida nos próximos meses.

Indignada com as mudanças, a servidora critica a Secretaria de Saúde e afirma que as decisões têm sido arbitrárias e pouco pensadas. “O profissional ser remanejado assim é uma forma abrupta de interromper nosso tratamento. Por aqui, as coisas estão um caos”, acrescenta.

A angústia vivida por Ângela é compartilhada pela aposentada Margarida Milhome, 81, diagnosticada com leucemia. A rotina de tratamento leva a paciente à unidade de saúde três vezes por semana há 11 anos. “Abalou minha saúde mental e física e também a relação com a médica, que é minha amiga”, desabafa Margarida, sem ter sido avisada previamente da saída de Margarete do hospital.

Embora tenha começado a funcionar em novo modelo de gestão em janeiro, a troca de funcionários continua. A previsão da direção do instituto é que a contratação dos funcionários leve mais dois meses. Isso porque muitos dos processos seletivos ainda estão em andamento.

Tempo que pode ser longo demais para o aposentado Domingos Arruda, 63. Ele trava batalha contra um câncer na medula e diabetes, sendo atendido tanto na oncologia como na hematologia. “Estou revoltado. Esse câncer não tem cura, é só um paliativo. O hospital não tem um mínimo de planejamento. A tendência é virar um caos lá dentro”, reclama.

Prazo
Antes de se transformar em instituto, a unidade tinha 3.236 servidores. No fim de 2017, em meio a questionamentos judiciais, o governo ofereceu oportunidade para que os funcionários informassem se queriam ou não ficar na maior unidade de saúde do Distrito Federal. O prazo dado foi até 28 de dezembro.

Do total, 2.442 responderam o questionário: 1.941 optaram por ficar, e 501 desejavam ser redistribuídos. “Os que não participaram da consulta [794] foram automaticamente classificados para permanecer no Hospital de Base. Assim, 2.735 continuarão a trabalhar nele”, informou, na ocasião, a Secretaria de Saúde.

 

A autônoma Neidelena Regina de Macedo Nobre, 49, é portadora de uma doença crônica e também está preocupada com as alterações. “Eles estão desmontando as equipes e isso tem nos deixado em pânico”, disse. Sentimento compartilhado pela professora Telma Oliveira, 50, que trata de anemia falciforme. “Os profissionais que ficaram estão estressados com as mudanças. Nunca tinha visto os médicos tão nervosos”, relata.

Desmonte da Saúde
Coordenador da Associação Brasiliense de Pessoas com Doença Falciforme (Abradfal), Elvis Silva Magalhães se mostra preocupado com substituição de mão de obra. Embora esteja curado da enfermidade, devido a um transplante de medula óssea realizado há mais de 10 anos, ele luta para que cerca de 2 mil pessoas no DF possam se tratar regularmente. “A doença falciforme vai perder muito com essas mudanças, pois o risco de ocorrer um óbito é enorme”, alerta.

“A doença não espera. O termo ‘novos profissionais’ me assusta. Dói ver tudo o que foi construído ser desmontado. Estamos assistindo à pior gestão da saúde na história do DF” Elvis Silva Magalhães, coordenador da Associação Brasiliense de Pessoas com Doença Falciforme

Já o presidente da Associação dos Renais Crônicos de Brasília (Arebra), Alessandro Lemos, 38, fala em queda no número de servidores no atendimento da hemodiálise. “Os pacientes têm se queixado de grandes filas, demora no atendimento e poucos servidores. Acredito que ainda não contrataram todos os funcionários da área”, aponta.

Além das associações, os sindicatos da saúde também subiram o tom contra o instituto. Presidente do Sindicato dos Auxiliares e Técnicos em Enfermagem do Distrito Federal (Sindate-DF), Newton Batista mostra-se receoso com a queda do nível dos profissionais. “Há diversos casos de trabalhadores sem experiência entrando [no lugar dos servidores], principalmente nas especialidades médicas e no centro cirúrgico”, alerta Newton.

Opositora do governador Rodrigo Rollemberg (PSB), a presidente do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde de Brasília (SindSaúde), Marli Rodrigues, acredita que o tempo das mudanças foi errado. “Como a saúde dispensa mais de 250 servidores das mais diversas áreas? Por que fizeram isso em ano de eleição? Será que não foi feito para empregar possíveis cabos eleitorais?”, suspeita.

Por meio de nota, o Instituto Hospital de Base (IHB) afirma ter contratado mais de 700 profissionais nos setores administrativo e de saúde, e garantiu seguir realizando novos processos seletivos. As substituições de pessoal devem ser concluídas em até dois meses.

Confira a íntegra da nota enviada pela Secretaria de Saúde:

Para manter o alto padrão de seu corpo de trabalho, os critérios para ingresso no hospital são rigorosos. Avalia-se a qualificação profissional, títulos, experiências anteriores, tempo de carreira, etc. Também são realizadas diversas dinâmicas de grupo, testes teóricos e práticos, estudos de caso, debates e outras atividades relevantes para cada área de atuação, seguindo o modelo de contratação dos hospitais privados de excelência no país.

Vale destacar que o IHB continua com um excelente quadro de servidores da SES no serviço assistencial, inclusive nas chefias das inúmeras especialidades ambulatoriais, cirúrgicas e de emergência, tendo em vista a competência dos mesmos, o tempo de casa e a experiência profissional.

Desta forma, os pacientes não têm sido prejudicados em suas relações interpessoais e assistenciais com médicos e equipes de enfermagem. Pelo contrário, eles têm sido beneficiados com a integração dos novos profissionais, que chegam para somar, e junto aos servidores, unir forças para proporcionar o melhor atendimento de saúde à população.

A comunicação do IHB voltada para os seus diversos públicos, inclusive usuários, tem sido realizada por meio de diversas mídias e canais de comunicação, por campanhas institucionais, palestras, eventos, reuniões, entre outros, além de conversas pessoais das equipes assistenciais, que lidam diretamente com os pacientes e familiares.

 

Fonte: Metrópoles

Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

 

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