SUFRÁGIO IRRISÓRIO

 

Miguel Lucena*

 

Conheci uma prostituta em Patos/Paraíba que, mesmo trabalhando dentro de um prostíbulo, odiava ser paga na frente de terceiros. Considerava uma humilhação receber abertamente pelo serviço que prestava. Pegava o dinheiro no quarto ou por baixo da mesa do bar. Era uma dose cavalar de fingimento.

A democracia vive assim. Ela é necessária, porque nos dá a liberdade de expressar opiniões pelos mais diversos meios, mas é frágil e distorcida no que respeita ao acesso ao poder.

Qualquer cidadão pode se candidatar, se estiver na plenitude de seus direitos políticos. Esqueceram de inserir na Constituição e na lei: e se tiver dinheiro para gasolina, lanche, gráfica, internet, redes sociais, advogado e contador.

Quem tem empresa já sai na frente não só com dinheiro, mas também com empregados. Os donos de terceirizadas de segurança privada contam com um exército imbatível de cabos eleitorais. Quanto mais sobem os índices de desemprego, mais as pessoas se agarram aos contratos com uma tábua de salvação.

As próprias pessoas do povo, com alguma noção da realidade, comentam que gostariam de se candidatar, mas não o fazem por falta de recursos.

Parte dos eleitores imagina que, ao se candidatar, o candidato herda de alguém uma mala de dinheiro. Começam, então, os pedidos mais estapafúrdios: no Gama, uma mulher pediu uma casa; em Sobradinho, um homem pediu dois dentes; outro pediu uma festa de 15 anos para a filha; no Sudoeste, uma moça de classe média alta pediu uma bunda de silicone.

Os atores políticos cegam para a realidade e continuam pedindo dinheiro em troca de apoio. Parece que Mensalão (nacional, mineiro e brasiliense) e Operação Lavajato nunca existiram.

Como dizia Anísio Teixeira, o sufrágio universal é mesmo irrisório.

 

*Miguel Lucena é Delegado da Polícia Civil do DF, jornalista, escritor e articulista do Brasília In Foco News

 

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